quinta-feira, setembro 28, 2023

Racismo malpassado no churrasco de Páscoa, por Cozinha Bruta

Leia também

Solange Almeida vai receber título de Cidadã Sergipana

A Assembleia Legislativa de Sergipe aprovou nesta quarta-feira, 27...

Cinemark tem ingressos a R$12 nos shoppings Jardins e RioMar Aracaju

Semana do Cinema, promovida pela FENEEC, acontece a partir...

Shopping Jardins realiza Festival de Forró a partir deste domingo, 1º de outubro

Apresentações musicais e aulão de dança integram a programação...

Lucas Campelo realiza oficina gratuita de acordeão

Atividade voltada a crianças a partir de 6 anos...

Mal aí por atrapalhar o feriadão da família brasileira com assuntos incômodos. O cardápio da Semana Santa 2022 é racismo malpassado.

O domingo de Páscoa, para os cristãos observantes, marca o retorno dos banquetes festivos à base de carne –depois dos 40 dias “peixetarianos” da Quaresma, em respeito ao martírio de Jesus.

Foi certamente para celebrar a Páscoa que alguém pediu orçamento de churrasco, para alimentar 50 pessoas no próximo domingo (17), a Tatiana Pretona –assadora profissional que atua em eventos carnívoros e festas particulares.

Tatiana respondeu ao pedido e passou alguns dias sem abrir as mensagens do Instagram. Quando voltou ao aplicativo, ela ficou anestesiada –palavra que repetiu várias vezes ao longo da conversa por telefone. A mensagem recusava os serviços de Pretona com o seguinte texto:

“Seu orçamento foi um dos melhores que recebemos, porém infelizmente não estaremos contratando seus serviços pois nosso cliente não gosta de pessoas da cor da sua pele.”

O tom pretensamente educado parece um arremate de sadismo no discurso racista escandaloso e inacreditável.

“Fiquei muitos dias sem dormir”, conta Pretona. “Aliás, ainda estou sem dormir.”

A churrasqueira não quer expor ou denunciar a autora da injúria (pelo “obrigada”, presume-se que seja uma mulher). “Não vou dar palco para essa gente”, declarou Tatiana nos stories (posts temporários) do Instagram.

A cautela de Pretona tem ainda outra razão. Depois que ela fotografou a mensagem ofensiva, a pessoa que lhe escreveu apagou o texto e bloqueou a churrasqueira no aplicativo. “Tinha medo de que pensassem que eu estava mentindo para me promover.”

Não conseguiu segurar. Publicou a captura de tela da resposta impublicável em sua própria conta. “Quer saber? Foda-se”, desabafou, “desculpe o palavrão”.

O ataque à churrasqueira negra diz um bocado sobre o mundo em geral, o Brasil em particular e, numa lupa ainda mais fechada, sobre a cultura “macha” e geralmente reacionária de churrasco, cerveja, rock pesado e motocicletas.

São raríssimas as mulheres nesse meio –as colegas Larissa Morales e Paula Labaki, Lígia Karazawa e a própria Tatiana são heroínas num ambiente inóspito. São raras também as pessoas pretas.

Mulheres pretas, então, podem ser contadas nos dedos de uma mão. A bem da verdade, eu só conheço a Pretona. Conheci nesta quinta-feira (14), aliás, quando um dono de hamburgueria me enviou o desabafo dela por mensagem direta.

“A sorte é que a pessoa rejeitou o orçamento. Se tivesse aceitado e falado essa coisa no meio do churrasco, a capoeira ia ser lá mesmo.”

Tatiana Pretona, mãe e moradora do Parque do Lago, nas profundezas meridionais da periferia paulistana, vive com a discriminação desde que nasceu. Enfiou-se num meio em que sempre foi corpo estranho e foi levando, calada e resignada, as “brincadeiras” racistas de que sempre foi vítima. Até esta semana.

“Cansei.”

(Siga e curta a Cozinha Bruta nas redes sociais. Acompanhe os posts do Instagram e do Twitter.)


LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.



Fonte feed: Via Feed Folha de S.Paulo