Para o Dr. João Paulo Cristofolo, os médicos precisam estar preparados para prescrição de forma assertiva. A falta do ensino nas universidades pode estar ligada ao preconceito envolvendo o uso da planta
Esse ano, completa 10 anos, que o Brasil abriu as portas para a cannabis medicinal no país. Cerca de 82% dos cultivos de cannabis no Brasil são dedicados a uso medicinal. Com a proposta de ser um tratamento alternativo para pacientes que não tinham efeitos positivos com o uso de medicamentos tradicionais, o direito do uso medicinal da planta foi recebido com um saldo positivo. Não à toa, 430 mil brasileiros realizem terapia à base da Cannabis medicina no Brasil, segundo a Associação Médica Brasileira. Apesar dos inúmeros benefícios cientificamente comprovados, o Canabidiol e o Tetrahidrocanabinol, principais formas da cannabis em sua forma clínica, ainda são um mistério para diversos profissionais da área, principalmente por não estar inserida na grade curricular do curso de medicina de várias universidades
Para o dr. João Paulo Cristofolo, médico e sócio-fundador do Grupo CONAES Brasil, instituição especializada no ensino médico para prescrição de cannabis medicinal, a atualização no ensino é essencial. “Adicionar aulas sobre a prescrição dos componentes da planta na grade curricular é fundamental para preparar os futuros médicos a utilizarem essa alternativa terapêutica de forma segura e eficaz. A cannabis medicinal tem mostrado benefícios em diversas condições médicas, incluindo epilepsia refratária, dor crônica, esclerose múltipla e náuseas induzidas por quimioterapia. Ensinar os profissionais de saúde sobre sua prescrição, dosagem, formas de administração e possíveis efeitos colaterais é essencial para garantir que eles estejam aptos a incorporar essa opção em seus tratamentos”, ressalta Cristolofo.
Avanço do canabbis medicinal no SUS
A busca pela especialização em relação à prescrição da cannabis medicinal se torna urgente atualmente, isso porque diversos estados e capitais do país estão adicionando medicamentos feitos através da planta na grade de tratamentos feitos pelo SUS (Sistema Único de Saúde). O Governo de São Paulo iniciou o fornecimento de remédios à base da cannabis, para todo o estado, no último mês. Já a Câmara de Vereadores de Cuiabá iniciou a votação para a aprovação de um projeto de lei que regulamenta o fornecimento de medicamentos à base de cannabidiol também pelo SUS.
“A falta de ensino sobre a cannabis medicinal nas faculdades de medicina resulta em uma lacuna significativa no conhecimento dos profissionais de saúde. Isso pode levar a uma subutilização dessa terapia, apesar de seu potencial comprovado. Sem uma formação adequada, médicos podem se sentir inseguros ou despreparados para prescrever cannabis medicinal, o que dificulta o acesso dos pacientes a tratamentos potencialmente benéficos. Além disso, a desinformação pode perpetuar estigmas e preconceitos associados ao uso da cannabis medicinal”, João explica.
O estigma, muitas vezes, ocorre pela falta de informação sobre a diferença entre o uso da cannabis em sua forma clínica e a para o uso recreativo, as duas possuem propostas distintas. A prova disso foi concluída pela pesquisa conduzida pelo Instituto Datafolha, contando com a participação de mais de 2.000 entrevistados, foi concluído que 72% dos brasileiros se mostraram contrários à legalização da cannabis para uso geral no país.
Além dos pontos citados pelo sócio-fundador do Grupo CONAES Brasil, a desatualização da grade curricular pode levar a riscos significativos à saúde pública, incluindo prescrições inadequadas ou errôneas, resultando em tratamentos ineficazes ou potencialmente prejudiciais. A falta de acesso a terapias eficazes, especialmente para pacientes com condições que não respondem bem aos tratamentos tradicionais. Continuação do uso de medicamentos com efeitos colaterais severos quando alternativas mais seguras estão disponíveis.
“Sabemos que ainda há diversos estigmas envolvendo o uso da cannabis medicinal, há quem acha que não faz qualquer tipo de efeito, há quem ache que os pacientes se tornarão dependentes do canabidiol ou do THC. Quando médicos não possuem conhecimento, quando não sabem ao menos prescrever, a persistência do preconceito em relação à planta se perpetua, dificultando ainda mais a aceitação e a implementação de políticas de saúde pública, essa que reconhece seus benefícios”, afirma Cristofolo.
João também explica que a inclusão de aulas sobre cannabis medicinal no ensino médico provavelmente influenciará positivamente o aumento de estudos científicos nessa área. Isso porque futuros médicos serão expostos a novas áreas de tratamento durante sua formação, podendo despertar interesse em realizar pesquisas e ensaios clínicos para explorar ainda mais o potencial terapêutico da cannabis. Além disso, a familiaridade com o tema pode incentivar a busca por evidências científicas robustas, contribuindo para a legitimação e a expansão do uso medicinal da cannabis.
“O crescimento de estudos sobre o tratamento com cannabis medicinal traz diversos benefícios, especialmente para populações com doenças genéticas raras. Influenciando no desenvolvimento de terapias mais eficazes e personalizadas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes, além de identificar novos mecanismos de ação e possíveis usos terapêuticos da cannabis medicinal. Poderemos ter a redução da dependência de medicamentos tradicionais com efeitos colaterais significativos, como opioides e anti-inflamatórios”, pontua o médico.
O aumento da base de evidências científicas que pode apoiar a regulamentação e a inclusão da cannabis medicinal em protocolos de tratamento também poderão ser vistos. Por fim, poderá ter a melhora no manejo de sintomas como dor crônica, espasticidade e inflamação, proporcionando alívio para pacientes que muitas vezes têm poucas opções terapêuticas.